FACTÓIDES URBANOS: O “LEGADRÔMETRO” DA PREFEITURA DO RIO

 
1. “Nunca antes na história” do (des)planejamento urbano do Rio viu-se materializar a formulação de norma tão “surreal”, tanto em sua forma, quanto em seu conteúdo.
 
 2. A forma, (anti)jurídica, além de criar um neologismo incompreensível em um diploma legal (“legadômetro”) que, como tal, não tem nenhum sentido, o decreto nº 32886 de 8 de outubro de 2010, do Prefeito do Rio, inventa um trâmite institucional para avalizar as intervenções urbanas a serem feitas na Cidade para atender aos ainda incógnitos projetos para a Copa e para os Jogos Olímpicos.  E o faz com desprezo às instituições existentes, seja no procedimento de tramitação das licenças, seja em relação aos relatórios de impactos ambientais e de vizinhança. Tudo em descompasso com a Legislação Municipal urbanística existente, com o Plano Diretor vigente, e com o Estatuto da Cidade.

 
3. O conteúdo, além de incompreensível, se baseia em uma lei inexistente: o problemático projeto de Plano Diretor, ainda em tramitação na Câmara de Vereadores. Como, se o projeto é projeto, ainda?  São favas já contadas?
 
4. O decreto publicado é um factóide urbanístico; porém pode ter lamentáveis efeitos na desconstrução de uma administração pública profissional, e de um planejamento urbano isento, e democrático.
Certamente um equívoco institucional! E tudo, sempre, em nome dos “Jogos” (…)
 
Veja abaixo o texto:
DECRETO Nº 32886 DE 8 DE OUTUBRO DE 2010
 
Define o “Legadômetro” e determina as diretrizes a serem observadas na avaliação das intervenções urbanas e dos equipamentos esportivos e de apoio relacionados à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016.
 
CONSIDERANDO que é atribuição do Poder Municipal regular sobre o uso e ocupação do solo urbano e,
 
CONSIDERANDO que se encontra tramitando na Câmara dos Vereadores o Substitutivo N.º 3 ao PL N.º 25/2001, publicado no DOM de 19 outubro de 2006, Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro, de autoria do Poder Executivo (Mensagem 78/2006), onde o território municipal foi subdividido em quatro diferentes Macrozonas de Ocupação do solo denominadas Controlada, Incentivada, Condicionada e Assistida;
 
CONSIDERANDO que estas Macrozonas foram definidas a partir de fatores espaciais, culturais, econômicos, sociais, ambientais e de infraestrutura urbana específicos de cada uma delas;
 
CONSIDERANDO que o objetivo do Macrozoneamento foi estabelecer referências territoriais para determinar a densidade, a intensidade e a expansão da ocupação urbana, a aplicação dos instrumentos da política urbana e a definição de prioridades na distribuição dos investimentos públicos e privados;
 
CONSIDERANDO que a oportunidade representada pela realização de eventos de grande porte, impacto e interesse para a cidade do Rio de Janeiro, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, deve integrar-se às diretrizes estabelecidas para as Macrozonas de Ocupação do solo tais como definidas no Substitutivo Nº 3 ao PL Nº 25/2001;
 
CONSIDERANDO que as intervenções urbanas, inclusive os equipamentos esportivos e as edificações de apoio aos eventos deverão constituir-se, necessariamente, em legado urbano para todo o território da cidade e servir como estímulo para o desenvolvimento do Rio de Janeiro a longo prazo;
 
DECRETA:
 
Art. 1.º A área de planejamento 3 (AP3) e a região portuária na área de planejamento 1 (AP1), situadas na Macrozona de Ocupação Incentivada e a área de planejamento 5 (AP5), situada na Macrozona de Ocupação Assistida, terão prioridade tanto nos investimentos públicos quanto na localização de novos equipamentos voltados para a Copa do Mundo de 2014 e para os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016.
 
Parágrafo único. Os equipamentos permanentes referidos no caput do presente artigo ficarão como legado para a Cidade, e deverão servir como elementos impulsionadores do desenvolvimento local. (???)
 
Art. 2.º As regiões da Barra da Tijuca e de Jacarepaguá, situadas na Macrozona de Ocupação Condicionada, na área de planejamento 4 (AP4), deverão receber intervenções urbanas, inclusive equipamentos esportivos e instalações de apoio limitados aos compromissos assumidos com o Comitê Olímpico Internacional – COI e com a Federação Internacional de Futebol – FIFA.
 
Art. 3.º Todos os projetos relacionados à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, inclusive aqueles situados no Parque Olímpico, serão analisados pela Comissão de Avaliação dos
Projetos de Legado Urbano a ser composta por representantes das Secretarias Municipais de Urbanismo, de Meio Ambiente, de Transportes e de Obras, que emitirá parecer preliminar a respeito, sem prejuízo das análises técnicas a serem feitas pelos órgãos de licenciamento da Prefeitura.
 
Parágrafo Único. A análise preliminar da Comissão de Avaliação dos  Projetos de Legado Urbano deverá, necessariamente, levar em consideração os aspectos econômicos, sociais, ambientais, paisagísticos, de circulação de veículos, estéticos e de adequação das construções aos padrões de sustentabilidade e de conforto ambiental. As normas urbanísticas e ambientais para construção de equipamentos e instalações serão objeto de decreto a ser publicado pelo poder municipal.
 
Art. 4.° A Comissão de Avaliação dos Projetos de Legado Urbano deverá analisar a oportunidade e os impactos resultantes das intervenções propostas através do “Legadômetro”.
 
Parágrafo Primeiro: O “Legadômetro” será a ferramenta de avaliação dos impactos das intervenções propostas e incluirá quatro indicadores:
 
1- Econômico: Geração de empregos, formalização da economia e impacto na imagem da cidade do Rio de Janeiro.
 
2- Urbanístico: Alinhamento com as diretrizes do Plano Diretor da Cidade do Rio de Janeiro e requalificação dos espaços da vizinhança.
 
3- Social: Prioridade para o transporte de massa, expansão da oferta de habitação de interesse social e aplicação dos conceitos de
acessibilidade universal.
 
4- Ambiental: Melhorias na qualidade da água, do ar e do solo, e valorização do patrimônio ambiental natural e cultural.
 
Parágrafo Segundo. Aos projetos de intervenção serão atribuídas pontuações crescentes obedecendo aos seguintes aspectos:
 
1- Impacto negativo.
2- Sem impacto.
3- Impacto positivo apenas na fase de preparação dos eventos.
4- Impacto positivo durante a preparação e até um ano após os eventos
esportivos.
5- Impacto positivo durante a preparação dos eventos esportivos e no
longo prazo.
 
Art. 5.º A comissão de avaliação dos projetos de legado urbano reunir-se-á trimestralmente e publicará o resultado da sua avaliação na internet em até cinco dias úteis após a reunião.
 
Art. 6.º Para a adequação de projetos urbanos em curso ou os que vierem a ser realizados até 2016, situados nas áreas de influência dos equipamentos voltados para a Copa do Mundo de 2014 e para os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, observar-se-á o disposto no Decreto N.º 30.650 de 5 de maio de 2009.
 
Art. 7.° Este Decreto revoga o Decreto n.° 31.185, de 05 de outubro de 2009
 
Art. 8.º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
 
Rio de Janeiro, 8 de outubro de 2010; 446.º ano da fundação da Cidade.
 
EDUARDO PAES

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