Uma viagem ao Recife
Vale a pena conhecer Recife?
Sim, já que ainda guarda três marcos de identidade que lhe dão sentido: o vasto rio Capibaribe, que corta a cidade em vários pontos, a sua enorme praia mansa, com coqueiros em terra e arrecifes no mar, e o seu imponente Centro histórico que lhe explica a origem centenária, com seus conventos e casario.
O Capibaribe – belo – é um refresco para os olhos e, apesar de todo esgoto que suporta, continua fluindo. Por isso há esperança que, um dia, o governo lhe dê a devida importância. Não basta só despoluí-lo. É preciso conter as ações predatórias que continuam a consumi-lo, para que se torne novamente piscoso e uma excelente opção de transporte e lazer para a cidade.
Cabe ao Governo do Estado tomar estas medidas, já que é um rio de águas sob jurisdição estadual. À prefeitura do Recife caberia não licenciar edificações e impedir edificações e ocupações sem tratamento sanitário e cujo esgotamento é o pobre rio.
Massa de concreto
E as praias, especialmente a de Boa Viagem, tão famosa? Esta continua linda, se a percorrermos olhando sempre para o mar. Do outro lado da rua, porém, como muitas cidades brasileiras, a exemplo de João Pessoa e Belém, Recife também foi tomada por prédios cada vez mais altos, de 20 até 35 andares. E muitos !
Uma massa de concreto que corta os ventos da cidade e, pior do que isso, sem o redimensionamento viário adequado.
Sem metrô significativo e sem serviço de coletivos, hoje, os recifenses utilizam muito seus carros para transporte. E a consequência é que um percurso que se levaria 10 minutos, faz-se em não menos de uma hora a uma hora e meia! Um caos e um enorme atraso.
O BRT, com faixa exclusiva está sendo instalado. Mas, nas mesmas ruas estreitas, ele é apenas um arremedo de solução. Enfim, o crescimento verticalizado do boom imobiliário precedeu qualquer providência de planejamento estrutural na cidade. E agora, tudo fica muito mais difícil de consertar, infelizmente, nesta linda cidade.
E o seu centro histórico, como está?
Bem, este é sempre um assunto difícil, quando em um lado da cidade qualquer dono de terreno pode construir enormes prédios sem qualquer encargo urbanístico, enquanto que, do outro lado, uns poucos não só não podem usufruir da grande exploração do seu terreno, como têm obrigação de conservar sua “velha” casa, em nome de um patrimônio cultural, que é de todos!
Dois pesos, duas medidas para a situação acima relatada. Não funciona hoje e não funcionará no futuro a menos que se use adequadamente, em Recife, os instrumentos do Estatuto da Cidade. A Outorga Onerosa do Direito de Construir é a solução para o caso, desde que na forma que a cidade de São Paulo está implantando com o novo Plano Diretor de 2014, já em vigor.
Desde 2004, o centro histórico do Recife recebeu algumas melhorias significativas. Estas aparecem sobretudo a partir da Região Portuária, do local chamado Marco Zero.
Há ali um centro de artesanato de extremo bom gosto, com produtos interessantes e muito bonitos. Eles ainda não remetem por entrega postal aos compradores de outros estados e cidades. Quando o fizerem, certamente muito mais será vendido. Por enquanto, só o que os braços podem carregar, o que é muito pouco.
Impactos sobre a paisagem – Todo o cais o Recife é uma zona histórica da cidade. Portanto, é inexplicável, do ponto de vista conceitual, as torres anunciadas no chamado Cais Estelita, que é objeto de projeto especial de “renovação” urbana. Ora, a parte de torres na cidade é a outra, a da Boa Viagem.
Ali, no Cais Estelita, torres certamente impactarão a paisagem e a ambiência. Elas são injustificáveis, sobretudo se o pretexto for a “renovação”. Ali cabe sim, outro tipo de renovação urbana, compatível com a evolução urbana desta parte da cidade histórica.
Andando mais para o centro do miolo histórico, para o lado do enorme e lindo Convento do N.Sa. do Carmo e do Pátio de São Pedro, vemos algumas poucas renovações deste precioso centro histórico. Vale registrar que não longe dali, algumas instituições, como a OAB de Pernambuco, e o Ministério Público do Estado colaboram com a preservação instalando-se em prédios naquele local, devidamente revitalizados e conservados.
O centro histórico, no entanto, vive com a vibração de um intenso comércio popular. Se, por um lado este comércio mantém o centro vivo, por outro é predatório em matéria de conservação dos próprios prédios e dos espaços públicos, ambos – precaríos e muito sujos. Uma pena.
Porém, nada que os recursos urbanísticos provenientes do outro lado da cidade não possam financiar: lá, onde a super exploração do terreno urbano é autorizada.
Um plano urbanístico integrando esses interesses urbanos diversos seria muito bem vindo e até necessário, sem o que os recursos para fins de preservação deste e de outros centros históricos nunca serão suficientes.
Enfim, Recife ainda continua uma linda cidade, reconhecível pelos seus marcos e suas características. Mas é bom não abusar de sua enorme generosidade histórica e natural, pois mesmo uma cidade boa assim pode não resistir.
Recife ainda é um belo patrimônio do Brasil, dos pernambucanos e dos recifenses, que vale a pena cuidar e conservar. E isso, só com planejamento!
Confiram a Galeria de Fotos Recife 2014.
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