“Glória: um ciclo termina, outro inicia”

Em um misto de orgulho e repúdio, Silvia Steinberg descreve os encantos e desencantos de uma “vigilante do óbvio” diante às transformações de ontem e de hoje no bairro da Glória.

Sem título

c.1790.Igreja de Nossa Senhora da Glória do pintor brasileiro Leandro Joaquim.As águas da Baía de Guanabara chegavam até o sopé do Outeiro da Glória.

14 de julho de 2005, o DECRETO n.° 25.550, determina o tombamento definitivo do prédio de n.°710 [edifício Milton], da Rua do Russel, no bairro da Glória. O ANEXO I, especifica a relação de imóveis preservados no entorno do bem tombado na Rua do Russel. Lado par: 632 [Hotel Glória], 680 [edifício Itacolomi], 694 [edifício Itatiaia] e 724 [edifício Mayo].

A paixão pela cidade e pelo local une moradores que raramente pensam em “quanto vale” e sempre comentam “é muito lindo”! Os prédios construídos por volta de 1936 não têm garagem. O sino da Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro assinala as 12:00h e as 18:00h. No Parque do Flamengo milhares de pessoas reinventam o quotidiano sem qualquer preocupação em afirmar pertencimento a uma determinada classe social.

Vizinhos se aproximam da Ladeira do Russel seduzidos por um som harmonioso e instigante — é Carnaval e o Céu na Terra está ensaiando. Biguás ao alvorecer no rumo Sul, ao cair da tarde retornam ao Norte. Na baia de Guanabara barcos à vela pincelam de branco a belíssima paisagem. O mar azul, sabidamente poluido, insiste em conduzir o olhar pela ponte Rio‐Niterói, Icaraí, Fortalezas de Santa Cruz e de Laje.A Urca espreita por uma nesga de sol o bondinho do Pão de Açúcar.

2010 – a não sustentabilidade da obra do Glória Palace [rua do Russel 632] iniciou a degradação do meio ambiente, da qualidade de vida, do dia‐a‐dia da vizinhança. Noções elementares de respeito à cidadania substituídas por britadeiras com marteletes rotativos. “Estamos dentro da lei!

2011, 2012, 2013 – nuvens de uma poeira fina, que penetra a alma, registraram o desmonte de rocha em aproximadamente 2.500m² de um terreno de 8.600m², a 31m de profundidade.

Moradores da Rua do Russel, no bairro da Glória acreditam em renovação sem desprezo à população local e ao patrimônio arquitetônico. Lamentam o desrespeito ao Outeiro da Glória, colina de topo plano, mantida pela camada resistente, um morro testemunho da antiga posição da costa antes do recuo do front.

Não sabemos exatamente o que é a tão mencionada Classe A5, à qual se destina o Glória Palace. Ela parece desagradar‐se de tudo que nos é mais precioso, mas pensamos ser possível esclarecer com o projeto Visões do Futuro, que se inicia amanhã.

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(a) Silvia Steinberg . [vigilante do óbvio. designer]

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2 Resultados

  1. Um bom trabalho dentro de um blog que prima pela luta em favor dos direitos do cidadão, de sua tranquilidade e, acima de tudo, luta contra as sucessivas manobras do poder público e de setores privados interessados tanto em verbas públicas quanto em se apossar de lugares aonde a população tem seus momentos de lazer e de vida cotidiana normal. O desrespeito que se vê nessas circunstâncias é total. Enganosamente se diz que significam melhorias de qualidade de vida. No entanto, o que se vê é um sucessivo processo de destruição de logradouros, da própria estrutura geológica e das configurações psicogeográficas da cidade. Parabens!

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