No Rio, para o Porto “maravilha” uma resoluçãozinha pretensiosa, mas ilegal, inconstitucional e ineficaz

 

No Rio, o atual Secretário de Urbanismo, Infraestrutura e Habitação (ex-candidato à prefeito do Rio), Índio da Costa assinou, no último dia 28 de julho, uma resolução que o nosso fraternal blog UrbeCarioca chamou, de forma muito comedida, de “espantosa”.

Por este ato, o Secretário pretende proibir novos tombamentos na Zona Portuária ! Diz o art.1º:

Art. 1° As áreas definidas na Lei Complementar Municipal n.º 101/2009 nos anexos V e VI não poderão ser objeto de tombamento.

Espantoso é pouco para uma norma absurdamente ilegal, inconstitucional e ineficaz. O Secretário deve estar desesperado; é o que podemos inferir de um dos motivos expostos em suas considerações (*1), e traduzido no artigo 2º da Resolução (*2).  

O problema é que o irresponsável comprador de todos os índices de edificabilidade da Região Portuária – a Caixa Econômica federal – e que usou o dinheiro do FGTS para tanto, pode ter uma batata quente na mão.  O local é, sem dúvida, uma área histórica do Rio e epicentro da arqueologia histórica da Cidade E, por consequência, representa um rico patrimônio cultural ainda não protegido.

Pela Constituição Federal em vigor, é dever do poder público a proteção do patrimônio cultural (art.215 e 216). Não adianta espernear via resoluçãozinha (…). 

A pergunta é: por conta do risco financeiro que os então administradores do dinheiro do FGTS (*3) tomaram, comprando, excepcionalmente, a totalidade dos índices de edificabilidade da área, só para ao agradar o então prefeito Paes e às empreiteiras do Consórcio Porto Novo*, deve-se, por causa disso, impedir a obrigação constitucional do poder público proteger o seu patrimônio cultural?

Análise técnica – Qualquer analfabeto jurídico sabe que a resposta é não!  Os riscos da irresponsabilidade financeira da Caixa já estavam mencionados na análise que a equipe técnica da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) fez ao analisar, antes do leilão, o edital das CEPACs.

A CVM menciona em sua análise que as CEPACs lançadas poderiam ser afetadas, ao longo dos anos, até pela mudança da legislação municipal e por outras causas de interesse público, dentre elas, evidentemente, a revelação de patrimônio cultural na área.

Só não sabia quem não queria. O prefeito anterior (Paes), contrariando toda indicação do Estatuto da Cidade, implantou em seu Porto “maravilha” uma Operação Urbana na qual ele, o Governo Federal de então, através da Caixa e o Consórcio de empreiteiras pegariam, de uma tacada só, todos os bilhões para as obras a serem executadas no seu governo.  

Só que o dinheiro, que deveria vir dos investidores privados, não viria de uma “tacada” só, como queria a “turma”. A sacada foi sugar os bilhões do FGTS geridos pela Caixa.  E assim foi feito. Vendeu-se tudo.  Até agora, o desembolso da Caixa pode ter chegado a R$ 5 bilhões, já pagos à empreiteira. E o dinheiro acabou, já que o Fundo Imobiliário da Caixa não consegue vender, no momento, os CEPACs comprados.

Operações Urbanas, como as feitas em São Paulo, são operações urbanísticas de longo prazo. A Prefeitura vai vendendo aos poucos, ao mercado privado, os índices urbanísticos, na medida em que vai implantando o projeto. E, na implantação do projeto a longo prazo, há espaço e tempo dos interesses públicos, sejam eles urbanísticos, culturais, ambientais e sociais, irem se ajustando.

No Rio, por conveniência politiqueira, interessava pegar tudo de uma só vez, e dane-se o futuro. Mas, no futuro daquela área, que ora já se faz presente, já não interessam os negócios mal feitos; há interesses públicos que se impõem: os urbanísticos (os vereadores podem fazer outra lei complementar para a área, com outros índices e outro projeto), os culturais (tombamentos, sítios arqueológicos e outros registros culturais) deverão ser protegidos e áreas ambientais também.  

Os interesses públicos são sempre indeclináveis.  As autoridades públicas devem saber disso. Se não sabem, ainda está mais do que na hora de aprender.  E lembrar de um ditado de uma querida tia judia: “o que se paga em dinheiro, se paga barato”.  

O patrimônio cultural do Rio é insubstituível, e inegociável E muito barato, não interessa o preço!

*”CONSIDERANDO que o Fundo de Investimento Imobiliário Porto Maravilha – FIIPM administrado pela Caixa Econômica Federal – CEF investiu nas áreas do Porto do Rio de Janeiro, adquirindo os Certificados de Potencial Adicional de Construção – CEPAC previstos no art. 34 da Lei Federal n.º 10.257/2001 e no art. 36 da Lei Complementar Municipal n.º 101/2009, com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço –
FGTS;
CONSIDERANDO que o recurso utilizado na compra de CEPAC presume garantia de retorno do investimento para o próprio FGTS;”

*”Art. 2º Novas demandas de tombamento na região do Porto do Rio de Janeiro, nas áreas não definidas na Lei Complementar Municipal n.º 101/2009 em seus anexos V e VI, serão avaliadas previamente pelo Fundo de Investimento Imobiliário Porto Maravilha – FIIPM, administrado pela Caixa Econômica Federal – CEF e pela Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro – CDURP.”

*uns estão presos em Curitiba, como Fábio Cleto

* empreiteiras: Odebrecht, Carioca Engenharia, OAS

Veja também:

FGTS no Porto: sem habitação social?

Habitação Social no Porto: Plano “a jato” em discussão

Porto do Rio sem habitação de interesse social? Ganância ou ignorância?

Porto do Rio sem habitação: encenação governamental

Porto do Rio sem habitação: “revitalização” para inglês ver?

Projeto de lei incentivará habitação no Porto do Rio ou só sacrifica urbanismo?

Porto Maravilha: índices construtivos públicos serão mercadorias monopolizadas

Você pode gostar...

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

pt_BRPortuguese
pt_BRPortuguese