Medida Provisória da Liberdade Econômica e os alvarás e autorizações de funcionamento: inconstitucionalidade?

Amanhã, dia 13 de agosto, é provável que o Plenário da Câmara votará a Medida Provisória 881/2019, que tem o codinome de MP da Liberdade Econômica.

Ela própria se denomina assim, ao dispor, pomposamente, em seu artigo 1º que é uma “Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador, nos termos do disposto no inciso IV do caput do art. 1º, no parágrafo único do art. 170 e no caput do art. 174 da Constituição.

A MP é, conforme se declara, pretensiosa. Se é factível e bom que a União Federal, através de norma infraconstitucional disponha sobre regulação de atividade econômica, seu livre exercício e iniciativa, não cabe, por outro lado, a uma norma federal infraconstitucional dispor sobre como os Estados e Municípios, entes federativos, normatizarão e regulamentarão as atividades econômicas sob sua jurisdição federativa e no âmbito de suas competências constitucionais: meio ambiente, urbanismo, saúde pública, segurança e até interesses econômicos regionais e municipais.

Poder de Polícia – A regulação e normatização de atividades econômicas em função de outros interesses públicos constitucionais chama-se, no Direito Administrativo ocidental, de PODER DE POLÍCIA. Sua definição está no Código Tributário Nacional, artigo 78 que diz:

“Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.”

Esta categoria do Direito – o Poder de Polícia – é central em qualquer Direito Público ocidental, praticado em países como a França, Alemanha, Portugal, Espanha e, em especial, dos Estados Unidos, onde ele assume especial destaque no Direito Constitucional americano como base do sistema federativo dos Estados membros.

Portanto, em todos os países acima de base econômica liberal, nenhum deles, absolutamente nenhum, precisou colocar qualquer obstáculo ao Poder de Polícia de regulação das atividades econômicas para poder ter uma economia pujantemente capitalista e liberal!

Ou seja, desde meados do século XX, toda e qualquer atividade individual e/ou econômica pode ser objeto de regulação pelo Estado, através dos seus entes Federativos (no nosso caso a União, os Estados membros e os Municípios), em função de suas competências regulatórias e normativas derivadas diretamente do texto constitucional (e não de lei federal infraconstitucional). E o alvará ou licença de funcionamento é apenas o documento público que certifica o atendimento destas normas.

Questionamento – Daí a pergunta que não quer se calar: pode a União, através de lei ordinária, dispensar, genericamente, ato municipal que certifique a adequação para funcionamento de atividade econômica de norma regulada em função de interesse público municipal ou estadual? Em princípio, tendo em vista a forma abrangente de como está disposta na MP federal, entendo que não.

Registre-se, outrossim, que a MP federal não dispensou ou proibiu que os Municípios ou Estados regulassem as atividades econômicas em função de outros interesses públicos, e nem a sua fiscalização. Mas, por eles, e pretendendo substituí-los EM suas competências federativas, dispensou, genericamente, inúmeras atividades de obter junto às municipalidades o alvará inicial de funcionamento.

Da forma como foi escrita, a MP ousou, por lei federal, tentar impor que o interesse federativo econômico federal prevaleça sobre os outros interesses federativos estaduais e municipais. Por certo porque deve entender, indevidamente, os interesses regulatórios estaduais e municipais como interesses menores ou menos relevantes.

Estado Unitário –  – Mas, esse entendimento só caberia se fôssemos, no Brasil, um Estado Unitário, e não uma Federação. Portanto, o disposto no §3º do art. 1º tem redação legal de um Estado Unitário, não federativo:

“§ 3º O disposto no art. 1º ao art. 4º constitui norma geral de direito econômico, conforme o disposto no inciso I do caput e nos § 1º e § 4º do art. 24 da Constituição, e será observado para todos os atos públicos de liberação da atividade econômica executados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, observado o disposto no § 2º.”

É verdade que o cidadão anda desesperado com a situação econômica, e o Governo federal ansioso para mudar o panorama. E também é um suplício, em quase a totalidade das Prefeituras, obter qualquer documento, aí incluso o Alvará de funcionamento de atividades econômicas.

Mas, devemos jogar fora o bebê junto com a água suja do banho?

Sobre o assunto veja também “MP da Liberdade Econômica, a resolução CGSIM 51/19 e o licenciamento ambiental

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3 Resultados

  1. José Mauricio Ferraz disse:

    Pelo menos, considero a ex-Vereadora, uma exceção no melhor sentido desta palavra.
    Mauricio.

  2. José Mauricio Ferraz disse:

    Como sempre, a amiga Sonia Rabelo pontifica em suas argumentações. Acompanho sempre seus emails.
    Grato, Mauricio Ferraz

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