Estatuto das Guardas Municipais: lei federal interfere na competência de auto-organização dos Municípios

Por que uma lei federal sobre Guardas Municipais – civis – proposta por deputado federal (de São Paulo) e que irá intervir na organização administrativa dos serviços municipais de mais de cinco mil municípios brasileiros, dos mais diversos tamanhos, do Oiapoque ao Chuí?

Seria um lobby para guardar uma reserva de mercado nos serviços municipais?

Parece que sim, já que, em sã consciência, sabemos que, do ponto de vista da gestão municipal, a lei, da forma em que se apresenta, criará muitos problemas de conflitos de administração interna, como veremos adiante.

Antes, porém, cabe a pergunta: afinal, as guardas municipais são ou não parte efetiva no sistema nacional de Segurança Pública?

Sobre esta pergunta, a novíssima lei federal 13.022 recém sancionada pela Presidente não responde. Afinal, dividir competências entre as várias polícias já é “um saco de gatos”; e colocar aí mais uma corporação – a Guarda Municipal – é mexer no vespeiro das corporações militares e civis, federais e estaduais. Isso é difícil e, portanto, a lei deixou de lado.

O art. 144 da Constituição Federal prevê, explicitamente, quais os órgãos que compõem a Segurança Pública: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal (que podia ser dentro da Polícia Federal), Polícia Ferroviária Federal (!),  Polícias Civis, Polícias Militares e Corpos de Mombeiros Militares. Ufa!  Haja polícias para tão pouca segurança pública. Mas o caput deste artigo não inclui as Guardas Municipais.

O art. 144 vai mencionar as Guardas somente no §8º quando diz:

Os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei“.

Qual lei: federal, estadual ou municipal ? As três, pode ser. Mas, certamente, nos estritos limites da competência legislativa prevista na própria Constituição Federal.

Portanto é muito rudimentar se supor que a União possa “regulamentar” qualquer assunto previsto na Constituição como pretende sugerir o art. 1º da lei 13022 quando diz: “Art. 1º – Esta Lei institui normas gerais para as guardas municipais, disciplinando o § 8º do art. 144 da Constituição Federal.

O que então a União pode disciplinar em relação às Guardas Municipais? Muito pouco, a saber das competências legislativas previstas nos arts. 22 e 24 da Constituição Federal. Mas, dentre os incisos do artigos. 22 e 24, não encontramos nada que dê à União poderes para legislar sobre Segurança Pública em geral ou mesmo sistema nacional de segurança.

O que mais se aproxima disso é a sua competência para legislar sobre “defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil, mobilidade nacional” (inc. XXVIII do art.22), ou ainda sobre os seus serviços de Segurança Pública (inc.XXII do art.22 – “competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federal”).

Todos sabemos que Segurança Pública é basicamente um serviço público estadual. Portanto, é elementar que a competência para legislar sobre este assunto é de quem tem competência de prestar o serviço: os Estados. Consequentemente, se um ou outro Estado entendesse por bem integrar, nos termos de sua lei estadual de segurança pública, as Guardas Municipais, guardados os limites deste tema, aí sim, poderia eventualmente fazê-lo.

Mas a União e para todo o território nacional? Isso é uma barbaridade de espírito unitário: um atentado ao federalismo já tão enfraquecido no país!

O art.30 da CF é explicito ao dizer que cabe aos Municípios:

V – organizar e prestar diretamente (…) os serviços públicos de interesse local (…).  

E o que é mais municipal do que uma Guarda cuja competência é criada para proteção dos seus bens, serviços e instalações?  Como a União se permite dar regras para tal?

Vejamos três absurdos incisos da lei (art.5º), onde a pretensão de organizar serviços municipais chega a pontos extremos:

“XII – integrar-se com os demais órgãos de poder de polícia administrativa, visando a contribuir para a normatização e a fiscalização das posturas e ordenamento urbano municipal;
XV – contribuir no estudo de impacto na segurança local, conforme plano diretor municipal, por ocasião da construção de empreendimentos de grande porte;
XVIII – atuar mediante ações preventivas na segurança escolar, zelando pelo entorno e participando de ações educativas com o corpo discente e docente das unidades de ensino municipal, de forma a colaborar com a implantação da cultura de paz na comunidade local.”

A pretensão desta lei de tudo regular não se esgota aí. O mais grave ainda está para vir. É a confirmação de se armar as Guardas Municipais.

Isso é grave, pois é armando é que as guerras começam, sempre. Mas sobre isso falaremos em uma outra postagem.

 

 

 

 

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57 Resultados

  1. Com todo meu respeito ao autor deste estudo,eu sinto que esta pessoa não trata com respeito nem os debates que envolveram esta lei 13022 e mais nem respeita a corporação das guardas municipais ,tratando os mesmo como bandidos ,e mais não respeita a comunidade de bem que precisa de segurança ,é lamentável que ao invés de debater sobre um novo modelo de policia comunitária,amiga que mora no município tem família e conhece os problemas do município,so vou mostrar como este estudo é falho ,só basta analisar a parte que fala do agente municipal de segurança agir preventivamente dentro de uma escola com palestra e com a presença para orientar através de formação e pela presença pela vigilância,qualquer organização pode prestar este serviço imagine se o guarda municipal não pode ,somente quem não conhece a realidade da falta de segurança e o papel do guarda no novo modelo de policia pode ser contra ,finalizo pensando que bom que seria se ao invés de querermos acabarmos com a ação da gurda municipal se os mesmo estudiosos apresenta se proposta para melhora a educação ,como teríamos um pais melhor .

  2. BOM DIA!
    SOU GUARDA CIVIL MUNICIPAL MAIS DE 20 ANOS, E QUANTO AO SEU COMENTÁRIO NÃO CONCORDO, POIS ESTA VISÃO É UNITÁRIA, SE A POLICIA COMO ESTADUAL COMO SITA FIZESSE SEU TRABALHO EM CONFORMIDADES E SATISFATÓRIA, NÃO TERIAM DE DIVIDIR ATRIBUIÇÕES. ESTA LEI.13.022 VEIO PARA SOMAR, E NÃO TIRAR A COMPETÊNCIA DE OUTRAS POLICIAS, SABEMOS QUE TUDO É EM PROL DO POVO E PARA O POVO, O NOSSO MAIOR BEM. POIS BEM; LEI ATENTAMENTE A NOSSA CONSTITUIÇÃO, E VERA QUE A GUARDA CIVIL MUNICIPAL NÃO É DE AGORA, E SIM DE 1920, AO QUAL SE CHAMAVA ” GUARDA VERMELHA” A ANTIGA GUARDA NACIONAL, E POR ISSO AINDA ESTA INSERIDA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SOU GUARDA CIVIL MUNICIPAL E COM MUITO ORGULHO, POSSUO ARMA DE FOGO, CUMPRINDO TODOS OS REQUISITOS INSERIDOS NA LEI.10.826

  3. Alex disse:

    bom dia eu sou guarda municipal e respeito a opinião de todos porém não sou obrigado a concordar com as mesmas sou GM do município de Porto Real RJ somente nós sabemos o que passamos em serviço e dizer que não fazemos parte da segurança pública isso é balela pois quando colocamos o uniforme devidamente caracterizado o municipe não quer saber se é GM ou PM, ele municipe busca ajuda e quer resolver o problema, Aqui vai algumas atribuições da gm realizamos rondas em todo o território municipal e próprios municipais seja manhã, tarde ,noite e madrugada, organização e orientação de trânsito,grupamento ambiental entre outros. Essa semana por exemplo em um município vizinho Barra Mansa, dois guardas municipais foram esfaqueados em serviço fazendo ronda nos próprios municipais um dos GMS estava armado com a arma da corporação e acertou dois tiros no meliante agora te digo se não estivesse armado as famílias dos dois GMS estariam chorando suas perdas agora então dizer também que não precisamos portar armas é outra desculpa por quem não vive a realidade que nós guardas municipais vivenciamos LEI 13022 SIM e PEC 534 JÁ

  4. Gostaria de uma oportunidade de poder conversar melhor, pra entender o porque de veemência em contrário a lei 13.022. Para simplificar meu comentário, o caput do art. 144 da C.F diz que a segurança pública é dever DO ESTADO e não dos estados federados como argumentado acima, e quando a C.F diz ESTADO está se referindo ao ESTADO BRASILEIRO nele incluído os municípios. Tenho mais argumentos, e deixo pra caso surja oportunidade.

  5. Bom,gostaria de lhe perguntar qual seria o maior bem de um municipe ? e se e municipe, passa a ser de responsabilidade da prefeitura zelar pelo seu maior bem, que no caso e nao diferente e a populacao. Diante deste fato afirmo que a vida e o maior bem que possuimos ,entao se a guarda municipal foi criada para bens, servicos e instalacoes nao vejo problemas quanto a lei 13022. A ocasiao faz o ladrao, dito popular, quanto mais policia melhor e melhor com distincao, pois onde uma falhar a outra acerta. Forte abraco e respeito.

  6. marco brun disse:

    Desculpe pois essa matéria parece uma opinião pessoal e tendenciosa. Porque vocês deveriam estimular a unificação das polícias (Federal, Estadual e Municipal) mas isso sei que não vão fazer pois sim vai mexer num vespero. Sejam mais imparcial da próxima vez.

  7. Primeiramente, a questão em tela e complexa e para analisar de forma eficaz é necessário isolar ponto a ponto. Nesta senda existe dois âmbitos distintos que se convergem ao final, assim uma é a necessidade da sociedade por mais segurança, e o outro é o âmbito jurídico, ou seja, a legitimidade da atuação das GMs perante nosso texto constitucional. Diante disso, ainda que considere os pontos favoráveis como por ex. a maior presença do Estado na sociedade, ou ainda como citado pelo Emerson em se tratando de ser no município onde se tenha a maior necessidade decorrente do poder administrativo, é necessário compreender que a constituição de 1988 não permite a atuação das GMs pelos ditames da lei 13022. São inúmeras as controversas inconstitucionais que em síntese versa sobre o caráter preventivo que é exclusivo da policia militar, isso significa que as GMs não podem por ex. realizar patrulhamentos. Por seguinte trata se de uma forma de retirar a competência que é exclusiva dos Estados e terceirizar aos municípios sem garantir suporte financeiro e técnico já que a própria lei proíbe que outras policias façam o treinamento. Outro aspecto e que vincula o poder de policia de transito as GMs, contudo o próprio CTB não atribui as mesmas tal finalidade e tão pouco os órgãos de transito tem entendido a legitimidade destas a atuação no transito.

  8. lamentável essa briga besta enquanto isso o povo é assassinado todos os dias nos municipios do brasil.os bandidos é que não deveriam adar armados e andam e ninguém faz nada.aqui em juazeiro bahia o mês de abril esta terminando com 49 pessoas assassinadas mesmo com a guarda civil municipal e a pm nas ruas.espero que as policias sejam elas gcm,pc,pm passem a se respeitarem pois só vejo essa desunião entre vocês e só você é quem são as maiores vitimas.

  9. ATRIBUIÇAO DA POLÍCIA MUNICIPAL

    Aquele poder como a faculdade discricionária da Administração municipal de restringir a liberdade física ou espiritual dos munícipes – ou dos que se acham, momentaneamente, no Município, quando esta perturbe – ou ameace perturbar – a consecução do peculiar interesse da Comarca ou dos demais Munícipes.

    “Entende-se a razão pela qual o poder de polícia, no âmbito municipal, deva ser mais favorecido e mais amplo do que nas outras áreas, já que, nas coletividades publicas locais, a AÇÃO DA ADMINISTRAÇAO É MAIS DIRETA, INTENSA, PROFUNDA E FREQUENTE, em razão do maior numero de conflitos que surgem entre o poder publico e o administrado, reclamando-se, por isso mesmo, ação policial continua e eficiente “(cf. J. Cretella Junior, Direito Administrativo municipal, Rio, Forense, 1981, p.277).

    A ação da policia administrativa, no âmbito do Município, faz-se sentir antes que se manifestem desordens que ela pretende evitar, como também, assim que ocorrem essas desordens, intervindo o organismo policial para o restabelecimento do Estado anterior (cf. op. cit., Direito Administrativo Municipal, p. 279).

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